Replica-se aqui a notícia do jornal Público, pela jornalista Teresa Firmino que, sempre atenta, mostra o preocupante desinvestimento na Ciência nos últimos 4 anos. Podemos culpar a crise por baixar os valores absolutos, mas os valores relativos (em percentagem do PIB) são claramente uma opção política.
O último Inquérito ao Potencial Científico e Tecnológico Nacional (IPCTN) – o instrumento oficial de contabilização dos recursos humanos e financeiros do país em investigação e desenvolvimento (I&D) – revelou que a percentagem do Produto Interno Bruto (PIB) dedicada à ciência voltou a cair em 2013, pela quarta vez consecutiva. Esse valor foi então de 1,34%, recuando para valores anteriores a 2008.
O PIB investido em ciência revela o esforço total do país nesta área. Entre toda a riqueza produzida pelo país, indica a parte destinada a investimento em ciência. Além disso, a percentagem do PIB para actividades de ciência e tecnologia é um indicador do próprio desenvolvimento dos países.
No dinheiro que Portugal investe globalmente em ciência, tanto público como das empresas, há um ano que se destaca: 2009. Foi aquele em que mais se gastou em ciência desde sempre: 1,64% do PIB, o que correspondeu também a um máximo de 2771 milhões de euros. José Mariano Gago (1948-2015) era então ministro da Ciência, no segundo Governo socialista de José Sócrates.
Nos tempos em que o PIB em I&D continuava a subir, a apresentação dos resultados do IPCTN chegou a ter uma cerimónia pública, com pompa, como aconteceu com os dados do inquérito relativos a 2008: Mariano Gago e José Sócrates apresentaram-nos em 2009 no Centro Cultural de Belém, em Lisboa. Em 2008, tinha-se atingido 1,50% do PIB em ciência e ainda haveria mais um ano de crescimento, o já referido 2009.
Mas os efeitos da crise na ciência começaram a fazer-se sentir ainda enquanto Mariano Gago estava à frente da pasta da Ciência. O ano de 2010 marcava o início do caminho descendente do dinheiro aplicado pelo país em investigação científica: caiu dos 1,64% do PIB em 2009 para 1,60%.
A descida continuou em 2011, já com o Governo de Pedro Passos Coelho, em funções a partir de meados desse ano, e Nuno Crato como ministro da Educação e Ciência. Em 2011, desceu para o valor de 2008 – 1,50%. A quebra continuou em 2012 (1,41% do PIB) e em 2013 (1,34% do PIB).
Empresas gastam menos
A apresentação do PIB investido em I&D deixou de ser uma festa. Os últimos resultados do IPCTN, que se realiza desde 1982, foram divulgados recentemente no site da Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência(DGEEC). Esta recolha passou a ser anual desde 2008 (antes disso era de dois em dois anos), mas há sempre um desfasamento temporal na apresentação dos resultados, e é por isso que os números de 2013 são novos.
Os 1,34% do PIB gastos em 2013 em ciência corresponderam a 2268 milhões de euros – ou seja, menos 52 milhões de euros no total face ao ano anterior.
O sector do ensino superior, da administração central e das instituições privadas sem fins lucrativos (a maioria delas na órbita das instituições de ensino superior) investiu mais de metade do dinheiro total aplicado em I&D — ou seja, 0,71% do PIB, o que correspondeu a 1196 milhões de euros. Em todo este sector público, a maior fatia foi a do ensino superior, com 0,60% do investimento, o que equivaleu a 1017 milhões de euros.
Nos 1,34% do PIB para a ciência, os restantes 0,63% do PIB – ou 1072 milhões de euros – foram investidos pelas empresas. Se olharmos para os dados, vemos que a queda do dinheiro aplicado em ciência, face ao ano anterior, ocorreu nas empresas, uma vez que em 2012 tinham investido 0,70% (1153 milhões de euros), enquanto a fatia do sector foi de 0,71%, valor que se repetiu em 2013. A conta dá menos 81 milhões de euros gastos pelas empresas em 2013. E o Estado pôs mais 30 milhões de euros em relação ao ano anterior.
Uma quebra de série
Mas este último IPCTN traz duas alterações metodológicas que dificultam agora algumas comparações com o passado – porque se mudaram normas para definir ou observar variáveis ao longo do tempo, ocorrendo uma “quebra de série temporal”. Já não se estaria a comparar o mesmo.
O objectivo destas alterações, refere inquérito, foi aproximar a sua metodologia com os critérios do Manual de Frascati – da OCDE e que serve de guia técnico nos inquéritos de I&D –, “melhorando a comparabilidade internacional dos dados nacionais sobre I&D”. Porquê essas alterações agora? Porque o Manual esteve em revisão no último ano e meio e o IPCTN de 2013 procura ajustar-se a isso, para melhorar a comparação com os dados de outros países, esclarece a DGEEC ao PÚBLICO, por escrito, através do gabinete de imprensa do Ministério da Educação e Ciência.
Numa das alterações, a maioria das entidades antes classificadas como instituições privadas sem fins lucrativos foram reafectadas, para efeitos de descrição das suas actividades de I&D, sobretudo ao sector do ensino superior. Portanto, é possível comparar os dados globais (sobre os recursos humanos e a despesa) da administração central (Estado), do ensino superior e das instituições privadas sem fins lucrativos com o passado. Mas, isoladamente, para o ensino superior e as instituições privadas sem fins lucrativos já não se podem fazer comparações com o passado.
Na outra alteração, houve uma redefinição das categorias de pessoal afecto às actividades de I&D: as categorias de “investigador”, de “técnico” e de “outro pessoal” passaram a depender também das funções principais desempenhadas e não, como antes, exclusivamente da qualificação académica individual. “Antes, todos os indivíduos com actividades de I&D e com qualificação académica igual ou superior ao grau de bacharelato eram contabilizados na categoria de 'investigadores'; actualmente, no IPCTN de 2013, a classificação individual passou a depender também da função efectivamente desempenhada, pelo que nem todos os indivíduos com qualificação superior são considerados investigadores”, lê-se no inquérito. Esta mudança pode permitir ter uma noção mais aproximada do que se passa na realidade.
No caso do pessoal afecto às actividades de I&D, a alteração de metodologia resultou “num aumento significativo do número de indivíduos classificados na categoria de pessoal técnico em I&D, em detrimento do número global de investigadores”, refere o documento. Equivalente a tempo integral (ETI), em 2013 havia a trabalhar em Portugal 37.813 investigadores, apurou o IPCTN de 2013. Desses 37.813 investigadores existentes em 2013, a maior parte estava principalmente concentrada no ensino superior (25.760) e nas empresas (10.025). Os restantes estavam no próprio Estado (1386) e nas instituições privadas sem fins lucrativos (642).
“A redefinição da categoria de ‘investigador’ implicou, por si só, uma diminuição de cerca de 12% do número total de indivíduos (em ETI) classificados nesta categoria. Em particular, caso se tivessem mantido em 2013 os critérios de classificação utilizados no ano anterior (2012), o número total de investigadores em Portugal teria registado um crescimento de 1%. A redução observada é assim uma consequência da quebra de série.”
Se olharmos para o número de investigadores em 2012, portanto antes da quebra de série, veríamos que foram contabilizados 42.498 (em ETI): utilizando os critérios de 2012, um acréscimo de 1% representaria assim 42.922 de investigadores em 2013, segundo o IPCTN.
Seja como for, entre 2011 e 2012, nos critérios usados antes da quebra de série, este inquérito tinha apurado uma redução de mais de 1550 investigadores (em ETI): tinha-se passado de 44.056 investigadores, em 2011, para 42.498 em 2012.
Ainda que afectando todos os sectores, a reclassificação do pessoal em actividades de I&D assumiu maior impacto nas empresas e na administração central. “[Mas] a quebra de série decorrente desta reclassificação não afecta os dados globais nacionais da despesa em I&D nem o número total de pessoas afectas a actividades de I&D”, frisa-se.
Não se poderia ter aplicado retroactivamente estas alterações – como se fez noutros inquéritos –, permitindo assim comparações com anos anteriores? “Embora desejável, a aplicação retroactiva das alterações metodológicas nem sempre é possível, e foi o que aconteceu neste caso”, esclarece a DGEEC. Para a reclassificação de pessoal em actividades de I&D, foi “necessário introduzir no IPCTN de 2013 uma nova pergunta”: “Como esta pergunta não constava nos IPCTN de anos anteriores, não temos a informação necessária sobre as actividades específicas dos respondentes em anos anteriores para os reclassificarmos agora segundo os novos critérios.”
PIB investido em ciência caiu em quatro anos seguidos
Em 2013, Portugal investiu em ciência 1,34% do PIB, indicam os últimos dados estatísticos. As empresas gastaram menos. A queda do dinheiro aplicado pelo país em ciência já vem desde 2010, o primeiro de inversão da subida, depois de em 2009 se ter atingido um máximo de 1,64% do PIB.
Gráfico do dinheiro gasto em investigação em Portugal, por percentagem do PIB (em cima) e valores absolutos (em baixo) [adaptado de Jornal Público], com a indicação dos sucessivos governos. |
O último Inquérito ao Potencial Científico e Tecnológico Nacional (IPCTN) – o instrumento oficial de contabilização dos recursos humanos e financeiros do país em investigação e desenvolvimento (I&D) – revelou que a percentagem do Produto Interno Bruto (PIB) dedicada à ciência voltou a cair em 2013, pela quarta vez consecutiva. Esse valor foi então de 1,34%, recuando para valores anteriores a 2008.
O PIB investido em ciência revela o esforço total do país nesta área. Entre toda a riqueza produzida pelo país, indica a parte destinada a investimento em ciência. Além disso, a percentagem do PIB para actividades de ciência e tecnologia é um indicador do próprio desenvolvimento dos países.
No dinheiro que Portugal investe globalmente em ciência, tanto público como das empresas, há um ano que se destaca: 2009. Foi aquele em que mais se gastou em ciência desde sempre: 1,64% do PIB, o que correspondeu também a um máximo de 2771 milhões de euros. José Mariano Gago (1948-2015) era então ministro da Ciência, no segundo Governo socialista de José Sócrates.
Nos tempos em que o PIB em I&D continuava a subir, a apresentação dos resultados do IPCTN chegou a ter uma cerimónia pública, com pompa, como aconteceu com os dados do inquérito relativos a 2008: Mariano Gago e José Sócrates apresentaram-nos em 2009 no Centro Cultural de Belém, em Lisboa. Em 2008, tinha-se atingido 1,50% do PIB em ciência e ainda haveria mais um ano de crescimento, o já referido 2009.
Mas os efeitos da crise na ciência começaram a fazer-se sentir ainda enquanto Mariano Gago estava à frente da pasta da Ciência. O ano de 2010 marcava o início do caminho descendente do dinheiro aplicado pelo país em investigação científica: caiu dos 1,64% do PIB em 2009 para 1,60%.
A descida continuou em 2011, já com o Governo de Pedro Passos Coelho, em funções a partir de meados desse ano, e Nuno Crato como ministro da Educação e Ciência. Em 2011, desceu para o valor de 2008 – 1,50%. A quebra continuou em 2012 (1,41% do PIB) e em 2013 (1,34% do PIB).
Empresas gastam menos
A apresentação do PIB investido em I&D deixou de ser uma festa. Os últimos resultados do IPCTN, que se realiza desde 1982, foram divulgados recentemente no site da Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência(DGEEC). Esta recolha passou a ser anual desde 2008 (antes disso era de dois em dois anos), mas há sempre um desfasamento temporal na apresentação dos resultados, e é por isso que os números de 2013 são novos.
Os 1,34% do PIB gastos em 2013 em ciência corresponderam a 2268 milhões de euros – ou seja, menos 52 milhões de euros no total face ao ano anterior.
O sector do ensino superior, da administração central e das instituições privadas sem fins lucrativos (a maioria delas na órbita das instituições de ensino superior) investiu mais de metade do dinheiro total aplicado em I&D — ou seja, 0,71% do PIB, o que correspondeu a 1196 milhões de euros. Em todo este sector público, a maior fatia foi a do ensino superior, com 0,60% do investimento, o que equivaleu a 1017 milhões de euros.
Nos 1,34% do PIB para a ciência, os restantes 0,63% do PIB – ou 1072 milhões de euros – foram investidos pelas empresas. Se olharmos para os dados, vemos que a queda do dinheiro aplicado em ciência, face ao ano anterior, ocorreu nas empresas, uma vez que em 2012 tinham investido 0,70% (1153 milhões de euros), enquanto a fatia do sector foi de 0,71%, valor que se repetiu em 2013. A conta dá menos 81 milhões de euros gastos pelas empresas em 2013. E o Estado pôs mais 30 milhões de euros em relação ao ano anterior.
Uma quebra de série
Mas este último IPCTN traz duas alterações metodológicas que dificultam agora algumas comparações com o passado – porque se mudaram normas para definir ou observar variáveis ao longo do tempo, ocorrendo uma “quebra de série temporal”. Já não se estaria a comparar o mesmo.
O objectivo destas alterações, refere inquérito, foi aproximar a sua metodologia com os critérios do Manual de Frascati – da OCDE e que serve de guia técnico nos inquéritos de I&D –, “melhorando a comparabilidade internacional dos dados nacionais sobre I&D”. Porquê essas alterações agora? Porque o Manual esteve em revisão no último ano e meio e o IPCTN de 2013 procura ajustar-se a isso, para melhorar a comparação com os dados de outros países, esclarece a DGEEC ao PÚBLICO, por escrito, através do gabinete de imprensa do Ministério da Educação e Ciência.
Na outra alteração, houve uma redefinição das categorias de pessoal afecto às actividades de I&D: as categorias de “investigador”, de “técnico” e de “outro pessoal” passaram a depender também das funções principais desempenhadas e não, como antes, exclusivamente da qualificação académica individual. “Antes, todos os indivíduos com actividades de I&D e com qualificação académica igual ou superior ao grau de bacharelato eram contabilizados na categoria de 'investigadores'; actualmente, no IPCTN de 2013, a classificação individual passou a depender também da função efectivamente desempenhada, pelo que nem todos os indivíduos com qualificação superior são considerados investigadores”, lê-se no inquérito. Esta mudança pode permitir ter uma noção mais aproximada do que se passa na realidade.
No caso do pessoal afecto às actividades de I&D, a alteração de metodologia resultou “num aumento significativo do número de indivíduos classificados na categoria de pessoal técnico em I&D, em detrimento do número global de investigadores”, refere o documento. Equivalente a tempo integral (ETI), em 2013 havia a trabalhar em Portugal 37.813 investigadores, apurou o IPCTN de 2013. Desses 37.813 investigadores existentes em 2013, a maior parte estava principalmente concentrada no ensino superior (25.760) e nas empresas (10.025). Os restantes estavam no próprio Estado (1386) e nas instituições privadas sem fins lucrativos (642).
“A redefinição da categoria de ‘investigador’ implicou, por si só, uma diminuição de cerca de 12% do número total de indivíduos (em ETI) classificados nesta categoria. Em particular, caso se tivessem mantido em 2013 os critérios de classificação utilizados no ano anterior (2012), o número total de investigadores em Portugal teria registado um crescimento de 1%. A redução observada é assim uma consequência da quebra de série.”
Se olharmos para o número de investigadores em 2012, portanto antes da quebra de série, veríamos que foram contabilizados 42.498 (em ETI): utilizando os critérios de 2012, um acréscimo de 1% representaria assim 42.922 de investigadores em 2013, segundo o IPCTN.
Seja como for, entre 2011 e 2012, nos critérios usados antes da quebra de série, este inquérito tinha apurado uma redução de mais de 1550 investigadores (em ETI): tinha-se passado de 44.056 investigadores, em 2011, para 42.498 em 2012.
Ainda que afectando todos os sectores, a reclassificação do pessoal em actividades de I&D assumiu maior impacto nas empresas e na administração central. “[Mas] a quebra de série decorrente desta reclassificação não afecta os dados globais nacionais da despesa em I&D nem o número total de pessoas afectas a actividades de I&D”, frisa-se.
Não se poderia ter aplicado retroactivamente estas alterações – como se fez noutros inquéritos –, permitindo assim comparações com anos anteriores? “Embora desejável, a aplicação retroactiva das alterações metodológicas nem sempre é possível, e foi o que aconteceu neste caso”, esclarece a DGEEC. Para a reclassificação de pessoal em actividades de I&D, foi “necessário introduzir no IPCTN de 2013 uma nova pergunta”: “Como esta pergunta não constava nos IPCTN de anos anteriores, não temos a informação necessária sobre as actividades específicas dos respondentes em anos anteriores para os reclassificarmos agora segundo os novos critérios.”
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