sábado, maio 31, 2008

Evolução convergente vs. Evolução divergente


Se há tema que me atrai na paleontologia é a evolução convergente. Ou dito de outra forma, em linhagens diferentes é adquirida um aspecto morfológico (genético ou comportamental, na biologia) análogo. Exemplificando: o caso já gasto dos golfinhos e dos ictiossauros, ambos com um corpo fusiforme e hidrodinâmico. No entanto, os ictiossauros são Ichthyopteriygia (uma linhagem com afinidades com os lagartos – Lepidosauromorpha) e os golfinhos são mamíferos, como todos sabemos. Quer os ictiossauros, quer os golfinhos adquiriram a condição fusiforme e hidrodinâmica adaptada à vida aquática a partir de linhagens distintas que não possuíam a priori essa condição. O conceito biológico que aqui subjaz é a analogia, oposto à homologia. Uma característica homóloga é partilhada pelos animais do mesmo grupo (quando me refiro a grupo pode ser família, género, ordem, ou dito de outra forma: a todos os taxa supra-específicos). Por exemplo, os primatas possuem todos uma ‘estrutura social organizada’, característica, portanto, homóloga a todos os primatas. Que é também uma característica análoga às formigas, que não pertencem à mesma linhagem dos primatas.

Já agora, existe também a chamada evolução divergente… Exemplos clássicos são os tentilhões das Galápagos – que levaram Darwin a congeminar a teoria da evolução através da selecção natural – ou os peixes ciclídeos dos grandes lagos africanos. O exemplo dos peixes ciclídeos é verdadeiramente interessante! Estes peixes, agora em voga para os aquariofilistas, encerram em si uma das lições mais interessantes da evolução. Os grandes lagos africanos (Tanganika, Malawi e Victoria) se repararem, estão mais ou menos alinhados de norte para sul. Há cerca de 9-12 milhões de anos naquela região começou a acontecer algo semelhante ao que está relatado no romance “A Jangada de Pedra” e, África estava prestes a separar-se em duas…Mas bom, não é essa a história agora, aconteceu que com o início da separação do continente africano foram criadas depressões intervaladas temporalmente que rapidamente foram preenchidas por água, permitindo assim que algumas espécies de peixes as povoassem. O que aconteceu foi que de algumas espécies originais de ciclídeos, tornaram-se muitas… num curto espaço de tempo. Com tanto para fazer, os primeiros ciclídeos especializaram-se em cada vez tarefas mais diversas, desde alimentação de moluscos de concha dura a raspadores de algas. Em suma, as primeiras espécies de ciclídeos rapidamente divergiram em muitas outras. A maior evidência para que os grandes lagos tenham sido inicialmente colonizados por um pequeno número de espécies é que a diversidade genética num mesmo lago é muito menor do que de lago para lago. Ou seja, apesar de no mesmo lago coexistirem raspadores de algas e quebra-moluscos estes são mais semelhantes entre si do que os raspadores de algas e quebra-moluscos do lago vizinho!!

Leituras sugeridas:

Carroll R. 1997 Patterns and processes of vertebrate evolution. Cambridge university press, New York.

Benton M. 2000 Vertebrate Palaeontology 2nd edition. Blackwell science, London.

segunda-feira, maio 26, 2008

Fósseis de lagartos jurássicos regressam a Portugal

Os fósseis de Squamata (lagartos e afins) do Jurássico superior de Portugal estão de regresso ao seu país de origem. Estes fósseis foram recolhidos por uma expedição alemã liderada por Freidrich-Franz, Henkel, Krusat e Kühne ao longo de mais de dez anos nas Minas da Guimarota, Leiria e de Porto Dinheiro e Porto das Barcas, Lourinhã. Os lagartos do Jurássico superior de Portugal constituem uma colecção única e absolutamente rara em termos do número de formas e quantidade de espécimes. Entre os fósseis mais espetaculares encontram-se: Parviraptor, Saurillodon, Becklesius e Paramacellodus... com mandíbulas ou maxilares inteiramente preservados, apesar da escala diminuta, não passando muitas vezes dos 3mm. Os fósseis foram trazidos da Universidade Livre de Berlin por Michael Caldwell (University of Alberta) e Randall Nydam (Midwestern University), dois especialistas em Squamata.


Na fotografia: Miguel Ramalho, Randall Nydam, Octávio Mateus e Michael Caldwell.

sábado, maio 24, 2008

Jurassic Foundation dá prémio a dois portugueses





Reposição integral da notícia por FILOMENA NAVES em Diário de Notícias (http://dn.sapo.pt/2008/05/24/ciencia/jurassic_foundation_premio_a_dois_po.html)

Projecto visa estudar ovos de dinossauros
Rui Castanhinha veio da biologia. Ricardo Araújo acabou há pouco engenharia geológica. Mas é à paleontologia - "ciência a meio caminho entre as duas", diz o primeiro - que se dedicam. Agora estão a estudar ninhos de ovos de dinossauros descobertos na região da Lourinhã e foi exactamente com esse projecto (Dinosaur Eggs and Embryos of the Lourinhã Formation, Upper Jurassic, Portugal) que ganharam um prémio da Jurassic Foundation - uma fundação criada com os lucros dos filmes Jurassic Park de Spielberg para apoiar pesquisas de paleontologia em todo o mundo.


A par da satisfação do reconhecimento internacional, os 2100 dólares (cerca de 1900 euros) do prémio "são um estímulo para avançarmos com a investigação", explicou ao DN Rui Castanhinha.


O arranque do trabalho de campo que ainda há a fazer está agendado para a próxima semana. "Vamos escavar mais ovos e recolher mais fragmentos de cascas, porque sabemos que eles estão lá", adianta o mesmo jovem investigador que, aos 25 anos (Ricardo Araújo é ainda mais novo, tem apenas 22), não é nenhum principiante nestas lides.


Tanto Rui Castanhinha como Ricardo Araújo já desenvolvem há pelo menos três anos trabalho de investigação em paleontologia, em regime de voluntariado, no Museu da Lourinhã, sob a orientação do paleontólogo Octávio Mateus, da Universidade Nova.


O projecto apoiado pela Jurassic Foundation não é de agora. "Já o tínhamos submetido à FCT [Fundação para a Ciência e Tecnologia, o principal organismo financiador da investigação em Portugal], em 2006, mas foi chumbado", conta Rui Castanhinha, sublinhando a satisfação de o prémio ser "um reconhecimento internacional da importância deste estudo".


Com 150 milhões de anos, "estes são os ovos de carnívoros mais antigos do mundo, não os estudar seria pecado mortal", diz o investigador.


O material que os dois vão analisar (sob a orientação de Octávio Mateus), além do que conseguirem escavar durante os próximos meses, inclui cinco ninhos de ovos de dinossauro encontrados em 1998 em Paimogo, cinco quilómetros a norte da Lourinhã, e um outro descoberto em 2007, em Porto das Barcas (na mesma região) que ainda não está sequer descrito. E há muita informação - sobre as espécies em causa, a sua reprodução, desenvolvimento embrionário, etc. - que o estudo pode arrancar aos fósseis.


Encontrar ninhos de ovos de dinossauros, muitos deles intactos, com os pequenos embriões lá dentro e ossinhos minúsculos todos muito bem definidos, não é exactamente comum. Na região da Lourinhã, porém, há vários sítios onde existem estes fósseis e ao logo de toda costa, naquela zona, podem encontrar-se com alguma facilidade fragmentos de ovos daquela época remota e daqueles animais extintos há 65 milhões de anos. Fazer esta investigação poderá ajudar a esclarecer também porque razão aquela zona tem esta riqueza.


Um dos ninhos de Paimogo, que já está estudado e que pode ser visto na exposição do Museu da Lourinhã, já contou a sua história: uma cheia matou a ninhada. Mas, com os outros, o que aconteceu? Dentro de um ano, Rui Castanhinha e Ricardo Araújo poderão ter uma resposta.

segunda-feira, maio 19, 2008

Jurassic Foundation

Transcrevo (com pequenas correcções) a notícia da Lusa:

Portugueses ganham prémio internacional para estudar ninho de ovos de dinossauro da Lourinhã
Lourinhã, Lisboa, 16 Maio (Lusa)


A Fundação do Jurássico, criada com os lucros dos filmes da saga "Parque Jurássico" de Steven Spielberg, atribuiu um prémio a dois jovens paleontólogos portugueses para estudarem os ovos com embriões de dinossauros descobertos na Lourinhã.

O ninho, com uma centena de ovos de dinossauros, alguns dos quais contendo embriões, é um dos maiores do mundo e foi descoberto em 1993 por Isabel e Horácio Mateus, colaboradores do Museu da Lourinhã, tendo a descoberta sido divulgada quatro anos depois.

Rui Castanhinha e Ricardo Araújo, de 25 e 23 anos de idade (na foto à esquerda e direita respectivamente) são os segundos portugueses a serem galardoados pela Fundação do Jurássico, oito anos depois do paleontólogo Octávio Mateus, do Museu da Lourinhã, que investiu a verba atribuída nessa bolsa nas escavações de vestígios de um dinossauro saurópode no concelho.

O prémio vai dar azo a um ano de intenso trabalho para "perceber como é que os dinossauros com 150 milhões de anos (Jurássico Superior) se reproduziam, como cresciam, que hábitos e que comportamentos tinham", disse à agência Lusa Rui Castanhinha.

O trabalho dos dois investigadores agora premiados vai desenvolver-se durante um ano, sob a orientação de Miguel Telles Antunes e Octávio Mateus (à direita na foto), paleontólogos da Universidade Nova de Lisboa, incidindo em campanhas de escavações e trabalhos laboratoriais que vão culminar num estudo, que poderá vir a ser publicado numa revista científica internacional.

"Vamos passar algumas semanas no campo para localizar as zonas onde foram descobertos os ovos, enquadrando com a geologia que havia na época, e depois vamos analisar a textura das cascas dos ovos para perceber o tempo de gestação" e comparar os seus comportamentos com animais actuais, como crocodilos e aves.

Sabe-se que o ninho descoberto na década de 90 pertence a um dinossauro carnívoro bípede da família dos terópodes.

Os primeiros achados existentes em todo o mundo foram descobertos pela primeira vez na Lourinhã e o dinossauro veio a ser apelidado de "lourinhanosaurus antunesi".

Os fósseis e o ninho desde dinossauro fazem dele uma das principais atracções do museu.

Trata-se de um animal que atingiria um comprimento de 4,5 metros de comprimento e pesaria 160 quilos, sendo muito idêntico ao "tiranosaurus rex", figura maior dos filmes de Spielberg.



Publicado simultaneamente em www.conjurado.blogspot.com/


Retirado e corrigido daqui.

Steneosaurus: um crocodilo mesozóico marinho


O Steneosaurus foi um crocodilo marinho que viveu em águas pouco profundas durante os períodos Jurássico e o Cretácico (180 a 130 milhões de anos atrás). Era uma criatura fantástica com um longo focinho semelhante ao dos actuais gaviais. A maioria dos crocodilos vivem hoje em dia em ambientes de água doce, mas o Steneosaurus e outros crocodiliformes eram marinhos.

Existe ainda muito por saber em relação a este género, nomeadamente o número de espécies válidas, as suas relações taxonómicas, bem como o percurso evolutivo de adaptação à vida marinha. Mais acresce que, ainda não é claro porque é que os ancestrais comuns dos crocodiliformes haver-se-iam deslocado para ambientes marinhos.

As questões de validade taxonómica são muito interessantes. A maioria das espécies referentes ao género Steneosaurus foram erigidas há muito tempo atrás, baseado num conceito de espécie que é bem diferente do actual. Os cientistas victorianos levaram a taxonomia do Steneosaurus a um verdadeiro caos, erigindo quase uma espécie por cada espécime recolhido. Mais de sessenta espécies de Steneosaurus foram criadas, das quais a grande maioria são hoje sinónimos – ou por outras palavras consideradas a mesma espécie.

O nome Steneosaurus foi dado inicialmente em 1825 por E. Geoffroy Saint-Hilaire. Muitos cientistas famosos da época trabalharam em restos fossilizados de Steneosaurus, incluindo Richard Owen: o pai da paleontologia e o fundador do Museu de História Natural, Londres. Os espécimes de Steneosaurus haviam sido recolhidos de um barreiro de onde prvinha a chamada ‘Oxford Clay’ de Peterborough, e hoje em dia uma ampla porção dos fósseis aí recolhidos estão armazenados no Museu de História Natural, Londres. Contudo, alguns dos espécimes foram comprados pelo Museu de História Natural da Irlanda em Dublin em Novembro de 1893.

Estes pormenores históricos também têm a sua piada. Alfred Leeds era um ávido caçador de fósseis do século XIX que, durante mais de vinte anos juntou uma coleção de fósseis de vertebrados de valor científico inestimável. Os melhores espécimes acabariam por ser adquiridos pelo Museu da História Natural de Londres, mas a grande maioria foi comprada pelo Museu Hunteriano. Uma pequena, mas interessante fracção, foi comprada pelo Museu de História Natural da Irlanda. Alfred Leeds, para além de fósseis de Steneosaurus, encontrou ictiossauros, plesiossauros e até mesmo um grande peixe a que se chamou Leedsichthys. Alguns dos espécimes mais importantes foram publicados e descritos por especialistas como Andrews (1910, 1913). Apesar de tudo, ainda muito há a saber sobre os detalhes históricos da colecção de Alfred Leeds: a proveniência exacta dos espécimes, por exemplo.

Alguns factos interessantes sobre o género Steneosaurus:

Dieta: Inferir a dieta directamente a partir de fósseis é um evento raro, uma vez que os conteúdos estomacais são raramente preservados. Contudo, o aparato mastigatório pode dar-nos algumas pistas. O longo focinho, morfologicamente semelhante ao dos gaviais, serviria analogamente para capturar peixe.

Adaptações ao estilo de vida marinho

Glândulas excretoras de sal – adaptação que permitiria ao género Steneosaurus excretar o excesso de sal.

Membros posteriores (pernas) reduzidos – Permitiria uma maior eficácia hidrodinâmica.

Mãos serviram como remos – Tal como noutras espécies adaptadas ao estilo de vida aquático e, um exemplo de um tipo de adaptação comum é o elongamento dos carpos (ossos da mão).

Cauda como a dos peixes – O Steneosaurus aprendeu bem a lição com os peixes!

Afinidades do Steneosaurus

Quem é que eram os amigos do Steneosaurus? O grupo (infra-ordem) ao qual o Steneosaurus pertence é designado Thalattosuchia (etimologicamente ‘crocodilos de água salgada’), e à família Teleosauridae. São todos crocodiliformes extintos em que o seu ‘parente’ mais próximo seria o Teleosaurus. Outros taxa relacionados são: Metriorhynchus, Pelagosaurus, Machimosaurus.


Imagem de: Mueller-Towe, I.J. 2006. Anatomy, phylogeny, and palaeoecology of the basal
thalattosuchians (Mesoeucrocodylia) from the Liassic of Central Europe. PhD Thesis.

domingo, maio 11, 2008

Sobre a natureza sexy da ciência


Parece-me um mito urbano considerar que todos os tópicos que a ciência aborda são igualmente interessantes, ou por outras palavras, despoletam em nós – consumidores de informação científica – o mesmo interesse. A ideia de que diferentes áreas do conhecimento despertam a mesma curiosidade é geralmente justificada pela ignorância: se não estudaste, não sabes quão interessante pode ser. Mas, ao que me posso aperceber, existe uma espécie de intuição que nos leva a preferir um assunto em detrimento de outro. Ou seja, conseguimos antever, quase que supresticiosamente, o quão interessante é uma dada linha de ideias. Posso afirmar que saber mais sobre a origem do universo me desperta um maior interesse do que a metalurgia. E, pelos vistos isto não se passa só comigo: o número de livros de ciência popular sobre cosmologia é esmagadoramente maior do que os livros sobre as propriedades do aço e ligas de carbono. Despoleta em nós inevitavelmente maior atenção! Da mesma forma que, mesmo dentro da minha área, paleontologia dos dinossauros desperta maior interesse que a paleontologia dos artiodáctilos. Ou, a estratigrafia atrai mais investigadores que a mecânica dos solos. Julgo que esta intuição está associada a tantas outras coisas que se passam connosco ao longo da vida: escolher uma pessoa para um dado emprego, escolher que curso tirar. E é nestes instantes cruciais de tomada de decisão que o nosso rumo fica traçado, por exemplo, ao comprar um livro sobre cosmologia em vez de metalurgia.

As razões/constrangimentos sejam eles culturais, históricos ou económicos para que tal discriminação intrínseca aconteça não me debaterei, o que é certo é que é um facto. E esse facto tem repercussões inevitáveis. A quem atribuir um prémio de mérito científico? A quem atribuir os fundos de investigação? À partida diríamos que independentemente das nossas intuições todos os tópicos da ciência têm a mesma legitimidade de serem explorados. Contudo, há áreas que têm um maior impacto directo na população, como a Medicina ou a Tecnologia. E são assim canalizados mais fundos para estas áreas, a Medicina tem mesmo fundos específicos paralelos aos meios tradicionais de financiamento. Mas por que não acontece o mesmo com a investigação em Engenharia Ambiental, que tem também um impacto directo nas populações não a curto, mas longo prazo? Acaba o argumento prático, dá início o argumento temporal, se assim quisermos chamar. Da mesma forma que estas pequenas incongruências se passam com o exemplo citado, muitas outras se poderiam esboçar.

No passado mês estive presente num encontro de biologia evolutiva e, tal como esperávamos, fomos os únicos paleontólogos num encontro dominado por biólogos moleculares. Mas o que há de ‘menos biologia evolutiva’ na paleontologia que exista na biologia molecular? Ambas as áreas deveriam igualmente contribuir para o desenvolvimento desta área maior. A assimetria de interesse numa e noutra área é reflectida pelo número desigual de investigadores. Cabe então às ‘minorias oprimidas’ espalhar a boa nova de quão sexy são as suas ideias, mesmo que estas sejam menos interessantes intrinsecamente. Este é o paradigma actual, e é assim muitas vezes que se consegue uma publicação na Nature. Mesmo que estes resultados pouco tenham de relevante, vamos lá pôr isto em termos sensuais para que os editores da revista apreciem. É a sensualidade não da ciência, mas sim de como as palavras estão escritas que acaba por falar mais alto. Dá ideia que para se fazer ciência tem de se ser um escritor de obras literárias best-sellers. Não desminto que pensar sexy em ciência não arrasta consigo uma postura positiva, nomeadamente o objecto de investigação tende a ser visto a uma escala maior, tende-se a comparar, a analisar implicações. Isso só por si já poderia justificar este tipo de abordagem.

Mas, em suma – e para não divagar mais – intuitivamente, por constrangimentos de variada ordem escolhemos tópicos que são pela sua natureza mais interessantes. Isto gera por si assimetrias na distribuição de oportunidades de investigação, à partida, independentes da intuição. No sentido de os investigadores contrariarem essa tendência ‘vendem o seu peixe’ tornando sexy as suas palavras em vez de insistirem na pertinência real, mesmo que cinzenta ou sem-graça, da investigação. Um vocabulário sexy faz-nos, apesar de tudo, pensar mais amplo.


Texto escrito em 5 de Janeiro de 2008.

sexta-feira, maio 09, 2008

Foto do dia: Oviraptor

Durante os passados 7 dias, coloquei uma selecção de fotografias que fiz de dinossauros.

Hoje, a última, é de um Oviraptor, um terópode ovirraptorídeo:

Voltarei a fazer esta sessão de "fotos do dia" caso tenha pedidos dos leitores deste blog.

quinta-feira, maio 08, 2008

Grandes linhas de pensamento na paleontologia de vertebrados: Extant Phylogenetic Bracket



Como é que se podem reconstruir tecidos moles em espécies extintas? A resposta a esta pergunta – sem recorrer aos raros tecidos moles preservados no registo fóssil – é muito difícil. Todo o cuidado é pouco! Isto por uma razão simples: é que assumirmos premissas erradas (ou fracamente suportadas), levam a conclusões erradas. Stephen J. Gould tem uma metáfora engraçada que frisa precisamente isso: “O nariz e as orelhas servem tão perfeitamente bem para colocar os nossos óculos”. O que Gould pretende dizer é: pouco interessa quão perfeitamente bem uma estrutura se adequaria a uma função que lhe poderíamos imaginar. Ou, trocando por miúdos, o lombo do cavalo não serve para os humanos lhe montarem em cima, nem os cães servem para os levarmos à rua; isso são propósitos que nós lhe damos, mas que não têm necessariamente que existir para aquilo que pensámos que poderia funcionar… Se não houver uma base teórica sólida para a reconstrução dos tecidos moles em animais que já não existem corremos o risco de inventarmos “costas de cavalos que servem para os humanos montar”. Essa base sólida deve-se hoje em dia a Larry Witmer, um prestigiado paleontólogo agora na Universidade do Ohio, que arranjou uma solução inteligente para não assumirmos premissas falsas nestas situações. A essa solução ele decidiu chamar: Extant phylogenetic bracket, ou num português macarrónico e fazendo uso dos meus pobres poderes de tradução: parênteses filogenético a partir dos seres vivos actuais. Esta solução é inteligente porque para além de ser ridiculamente simples, adequa-se com grande robustez à realidade da vida. Em que é que consiste então? Antes de mais, um ou dois conceitos-base que precisam de ser explorados: (i) árvore filogenética; (ii) clado; (iii) sinapomorfia. Em bem sei que estas palavras devem ter um cariz meio alienígena para a maioria dos leitores, mas dada a sua importância para a explicação desta história do parênteses tem mesmo de ser, e como dizia O’Neill: o que tem de ser, tem muita força.

Comecemos pela árvore filogenética. Nada melhor que o grego para dar uma ajuda: filo (amigo) + genética (“fazer nascer”, creio que ‘origem’ também não fica mal). Portanto, uma árvore filogenética é uma árvore dos amigos com a mesma origem. Não sei se foi bem conseguida esta etimologia, mas bom serve para o que quero dizer: estas árvores - compostas por vários ramos - dão-nos as relações entre os seres vivos. Ou se quisermos fazer jus à metáfora acima, dão-nos a ideia de quão “amigos” os seres vivos são entre eles, ou quão próximos estão eles na sua família… é ao fim e ao cabo uma genealogia, em que os ramos que compões a árvore não o avô e a avó Joaquina, mas sim espécies de animais e plantas que partilham características em comum.

E ora, daqui saltamos logo de seguida para o conceito de clado. Não pertencem ao “meu” clado todos os que não são da minha família. O senhor dali da frente no clube de vídeo não pertence ao “meu” clado, porque não possui um sobrenome “Araújo”. Na ilustração que disponibilizo a bactéria não faz parte do clado Vertebrata (dos vertebrados); mas a ave, o crododilo extinto, o peixe e homem sim!

E daqui salta logo o outro: o que é que todos os seres têm em comum neste exemplo à excepção da bactéria? Têm a coluna vertebral. A coluna vertebral é uma característica partilhada por todos os vertebrados, e daí o nome. A coluna vertebral é uma sinapomorfia dos vertebrados.

OK, explicada a terminologia passemos ao que interessa. Suponhamos que tínhamos encontrado um fóssil de uma espécie extinta de crocodilo, mas que infelizmente só tínhamos encontrado o seu crânio… Será razoável pensar num crocodilo extinto que não tivesse coluna vertebral? Só porque não tínhamos encontrado o resto do seu corpo fossilizado? Não porque, apesar de tudo, quer os peixes quer os humanos – que vivem actualmente – partilham com os restantes vertebrados uma coluna vertebral. Logo, não há razão nenhuma para pensar que um crocodilo só pelo facto de estar extinto (e de só termos encontrado o crânio) possa não ter coluna vertebral… De certo modo o parênteses serve para balizar as espécies (ou taxa) que partilham a mesma característica. De modo seco e bruto: num mesmo clado, se uma sinapomorfia é partilhada por duas espécies que vivem actualmente, então essa característica é também partilhada por uma espécie extinta.

Apesar deste raciocínio ser quase demasiado simples, só foi posto ao serviço da paleontologia na década de 1990… faz lembrar a lei zero da termodinâmica… como é que nunca ninguém se tinha lembrado?

O exemplo que dei do crocodilo, é meramente ilustrativo e só pretende explicar a lógica que lhe está por trás. Bons exemplos de situações em que o Extant phylogenetic bracket tem sido utilizado são os publicados pelo próprio inventor do conceito. Larry Witmer, perguntou-se um dia: onde ficaram as narinas dos dinossauros? E fazendo uso deste jogo lógico concluiu que as narinas nos dinossauros, salvo algumas excepções, ficariam na parte mais dianteira do seu crânio (Witmer 2001). E o seu raciocínio foi: existem aves actualmente => existem crocodilos actualmente => todos eles são arcossauros => todos eles na sua maioria têm as narinas na parte dianteira do crânio => os dinossauros são arcossauros (logo do mesmo clado que crocodilos e aves), então os dinossauros tinham as narinas na parte dianteira do crânio.

Será que conseguem arranjar mais exemplos deste género?

Foto do dia: Velociraptor

Velociraptor, terópode dromeossaurídeo:


quarta-feira, maio 07, 2008

Foto do dia: Edmontonia

Edmontonia, um anquilossauro nodossaurídeo:

terça-feira, maio 06, 2008

Grandes linhas de pensamento na paleontologia de vertebrados: parcimónia


Previno desde já os leitores deste post para o eventual enviesamento da filosofia geral dos textos subsquentes a este. Talvez hajam alguns tópicos que se podem considerar como ‘grandes linhas de pensamento’, mas que, contudo, não abordarei por não ter muita experiência na área (entre os quais se inclui a biostratigrafia e biogeografia). Com o decorrer do tempo irei colocando outros textos online.

Princípio da Parcimónia

Suponhamos o seguinte exemplo: hoje de manhã ao acordar verifiquei que o meu colega que dormia no quarto ao lado, já lá não se encontrava. O que lhe teria acontecido? O meu colega poderia ter sido raptado por extraterrestres durante a noite sem eu o ter notado? Sim, podia. O meu colega podia ter sido arrastado por homens que por sua vez se transformaram em lobos durante a noite e o levaram sem o ter notado? Sim, podia. O meu colega podia ter sido iluminado pela mão de Deus que por sua vez enviou um anjo, que comunicou aos seus arcanjos para levarem a alma e o espírito do meu colega durante a noite sem eu o ter notado? Sim, podia. Ou, o meu colega podia ter acordado mais cedo que eu e ido embora sem que eu o tenha reparado? Sim, podia.

Mas afinal, o que distingue estas diversas hipóteses para além da inverosimelhança dos lobisomens e dos arcanjos? O que nos leva a reconhecer que a última hipótese nos pareça imediatamente mais acertada que as restantes juntas?

Atente-se à primeira hipótese: “Meu colega raptado por extraterrestres sem que eu tenha notado” e, verifiquemos o que seria necessário para que tal fosse possível:

1) Existirem extraterrestres;

2) Que os extraterrestres se lembrassem de raptar o meu colega durante esta noite;

3) Que os extraterrestres tivessem escolhido o meu colega em detrimento de tantos outros milhões de pessoas no mundo;

4) Que os extraterrestres fossem capazes de se intrometer na nossa casa sem que eu tivesse notado;

5) Que os extraterrestres entrassem em casa sem que o meu colega o notasse;

6) Que os extraterrestres tivessem entrado em casa e raptado o meu colega sem que ele gritando me tivesse acordado, dando conta do sucedido…

7) Que tudo isto se desse antes de eu ter acordado. E por aí adiante…

Por outro lado, a última hipótese, a ser verdadeira, necessita de:

1) Que o meu colega tivesse acordado mais cedo do que eu;

2) Que o meu colega tivesse saído mais cedo do que eu, sem que o tenha notado.

A última hipótese é mais parcimoniosa, ou por outro lado, requer menos passos para que o sucedido, de facto, tivesse acontecido assim. Não garante a sua veracidade, porque com base na informação a priori que temos (i.e. que o meu colega não se encontra na cama após eu ter acordado) não poderemos negar que ele tenha sido realmente raptado por extraterrestres. Poderemos, isso sim, dizer que é muito mais simples a última explicação que a primeira.

Mas ora, o que é que este conceito (e este exemplo) meio estapafúrdio nos tem a dizer sobre a paleontologia, melhor ainda, sobre a evolução? É que é muito mais simples, por exemplo, pensar num veado que a partir de uma protuberância no crânio, acabou por desenvolver cornos cada vez mais longos (ou para ser mais correcto, foram seleccionados indivíduos cujos cornos relativamente mais longos, lhes proporcionava uma qualquer vantagem adaptativa); do que um veado que no alto da cabeça desenvolveu uma simbiose com fungos, que por sua vez lhes permitiu criar substrato suficiente para que plantas se desenvolvessem e que essas plantas permitiam uma ossificação mais efectiva levando ao desproporcionado crescimento de protuberâncias, que hoje chamamos cornos. Para além de que, se o último cenário fosse verdade, alguns destes passos intermédios ter-se-iam de verificar no registo fóssil (i.e. um esqueleto fossilizado de um veado com plantas na cabeça, ou qualquer um dos outros).

Um ponto problemático deste conceito é que pelo facto de a explicação ser mais simples, não a torna mais verdadeira… Ou seja, não temos garantias que a Natureza ‘se comporte’ parcimoniosamente. As únicas evidências que temos ao nosso dispor são os restos fossilizados dos organismos que um dia já pisaram o nosso solo, já nadaram pelos nossos mares e já voaram pelos nossos céus. É tudo o que temos, mas, ainda assim não parece estar tão longe da realidade: de facto temos no nosso registo fóssil, fósseis de cervídeos com cornos progressivamente (i.e. com o decorrer dos tempo) mais longos; ou, temos ancestrais dos cetáceos (artiodáctilos primitivos; cetáceos são as baleias por exemplo) com a abertura nasal cada vez mais posteriores - ou, cada vez mais para trás em relação ao crânio. Há outros conceitos, que poderiam aqui também ser explorados como a evolução direccional, ou os constrangimentos anatómicos/fisiológicos/filogenéticos/genéticos, mas isso fica para outras núpcias. Espero que com estes exemplos me faça compreender... Princípio da Parcimónia é abundantemente, trivialmente, exaustivamente usado para se criarem as chamadas hipóteses filogenéticas entre diversas espécies de animais. A parcimónia é a assumpção principal do cladismo, que pretende explicitar o percurso evolutivo dos seres vivos, graficamente ilustrados pelas árvores filogenéticas (ou árvores da vida se quiserem, ver figura).

Foto do dia: Barosaurus

Barosaurus, saurópode:

segunda-feira, maio 05, 2008

Foto do dia: Anatotitan

Esqueletos de Anatotitan (ornitópode hadrossauro):

domingo, maio 04, 2008

Foto do dia: Allosaurus


Allosaurus fragilis (terópode allosaurídeo),

em exposição no Museu de História Natural de Nova Iorque

sábado, maio 03, 2008

Foto do dinossauro do dia: Albertosaurus

Durante uma semana, tentarei fazer o post de uma fotografia de um dinossauro por dia. Hoje começamos pelo Albertosaurus:




sexta-feira, maio 02, 2008

Paleontologia avant garde


Hoje em dia existem tecnologias de ponta que estão ao dispor da ciência pura e, cada vez mais, revelando-se nas formas mais inesperadas. Hoje em dia a paleontologia de vertebrados não se resume à descrição anatómica é, pelo contrário, um domínio científico dinâmico e que resulta de vários híbridos com outras ciências aplicadas.

Análise de Elementos Finitos

A análise de elementos finitos é um conjunto de ferramentas matemáticas que inicialmente, na década de 1960, se remetia à resolução de problemas de engenharia mecânica. Apesar do nome esotérico o princípio é simples: dividir um corpo em diversos elementos discretos (i.e. bem indiviualizados). E para que servirá isso? Como foi dito, esta ferramenta, servia inicialmente para a análise de problemas de engenharia mecânica... o que implica forças, tensões e extensões e outros conceitos do género. Num corpo com uma forma complexa é difícil calcular os efeitos de uma força em todos os seus pontos. Por isso, alguém teve a ideia brilhante de não considerar um só corpo complexo e como a força nele se faria sentir em todos os pontos, mas sim muitos corpos simples e ver como a força provocada pelo corpo vizinho lhe afecta. Isto simplificava muito o trabalho dos computadores nos anos 1960... Entretanto as ferramentas informáticas foram-se desenvolvendo - ao ritmo que todos nós sabemos - e em vez de roldanas e engrenagens começou a poder ser processada informação em corpos cada vez mais intrincados. Emily Rayfield, agora na Universidade de Bristol, decidiu usar estas ferramentas não para rodas dentadas e veios hidráulicos, mas sim para fósseis... Para fósseis?? Sim, ao fim e ao cabo um crânio ou uma tíbia também é um corpo, decomonível em muitos outros pequenos corpos simples... E para que quereria ela fazer isso? Rayfield dedicou-se a um ramo chamado: morfologia funcional, ou por outras palavras, a partir de um estrutura inferir uma função. Estrutura: um crânio e uma mandíbula; função: mastigação, por exemplo. Os fémures e as tíbias substituiram assim os veios hidráulicos no software de elementos finitos. Somente em 1998, sai a primeira publicação de uma aplicação da análise em elementos finitos na paleontologia... e logo na revista Nature. É que estas ferramentas têm um enorme potencial, sendo efectivas para rever o decurso da evolução. Melhores estruturas - o côndilo de um osso, por exemplo - tenderão, por força da selecção natural, a ser seleccionadas... Hoje em dia este é, a meu ver, um dos campos mais promissores da paleontologia de vertebrados e da evolução no geral.

Tomografia axial computorizada (TAC)

Bolas... como é que eu consigo ver a estrutura interna do ouvido de um Tyrannosaurus sem ter de o partir? Aha, solução: façamos-lhe um TAC... Na verdade, por uma questão de coerência não se diz "Axial" a não ser que a tomografia seja feita ao longo de um eixo. É tempo de os radiologistas se confundirem com paleontólogos. Aqui, aliás como em todas as grandes ideias, o princípio é simples: o mesmo das radiografias, mas várias (muitas) e a 2D. As tomografias computorizadas também fazem uso dos raios-X. É emitida radiação X e esta atravessa ou não um dado corpo. Aos materiais cuja radiação os atravessa são designados radiotransparentes, o contrário radiopacos. Mas como estava a dizer, são feitas várias radiografias ao longo de um corpo... é como se este estivesse a ser fatiado. Hoje em dia, estes aparelhos permitem resoluções impressionantes, com distâncias entre as "fatias" na ordem das centésimas de milímetro.
Um dos exemplos que considero mais espetaculares de uso destas tecnologias é o de uma tomografia de um ovo contento embriões de um dinossauro ceratopsídeo. Conseguiu-se desta forma apurar ao nível do género a taxonomia dos ossos de embrião sem ter de remover um miligrama de matriz. Outra das aplicações mais bem sucedidas na paleontologia são as chamadas endocasts, ou endoréplicas, há falta de melhor termo em português. Não é mais do que uma réplica do interior de um crânio ou do ouvido interno - áreas geralmente inacessíveis. Paul Sereno na sua publicação sobre o Nigerasaurus usa resultados das tomografias para extrapolar a posição habitual de vários saurópodes, com base na orientação dos de alguns componentes do ouvido interno, intrinsecamente relacionados com o equilíbrio. Ver www.digimorph.org.
Outro exemplo quase aterrorizador da utilização de raios-X é o usado no European Synchrotron Radiation Facility em Grenoble, França, permitindo visualizar pequenos insectos através de âmbar opaco.

SEM - Scanning Electron Microscope

Na paleontologia talvez seja a tecnologia, das já citadas, a mais antiga. Em português: microscopia electrónica de varrimento. Tem sido usada intensivamente na determinação da microstrutura de cascas de ovo fóssil, mas também para a micropaleontologia no geral. Desde foraminíferos a dinoflagelados já todos foram sondados pelos coscuvilheiros electrões destes microscópios.


Filogenia

A filogenia por si não é uma ferrementa recente, Hennig desde a década de 1950 havia esboçado os seus princípios basilares, fazendo tabelas de zeros e uns para insectos coleópetros. Curiosamente só muito mais tarde, cerca do fim da década de 1980 ou ínicio da década de 1990, é que a filogenia e cladismo se assumiram como metodologias não só práticas, mas acima de tudo verdadeiras, que demonstravam que a evolução se rege, em grande medida, pelo "princípio da parsimónia". Mas bom, não é disso que pretendo falar. Actualmente, a filogenia é o resultado híbrido entre um programador informático e um biólogo. Rieppel, Goloboff, Farris são apenas alguns nomes que estruturam o pensamento e, necessariamente, as ferramentas informáticas que hoje são utilizadas trivialmente. Ver www.cladistics.com e corre uma matriz, logo de seguida.


Isótopos estáveis

Enquanto hoje muito se fala nos isótopos radioactivos (não-estáveis, portanto) alguém decidiu procurar os que, por seu turno, mantém as proporções relativamente constantes ao longo do tempo. O tipo de raciocínio que está por detrás desta técnica é mais ou menos o seguinte:
(1) alguns isótopos mantém-se contantes (i.e. não se decompõe noutros elementos), como o O16, independentemente da altura em que foram 'aprisionados' (e.g. na estrutura de uma rocha, ou num organismo). Por outras palavras, a quantidade de O16 que existia numa dada amostra no Cretácico, manteve-se constante até aos nossos dias;
(2) as proporções entre alguns isótopos (e.g. O18/O16) reflecte, por vezes, determinadas circunstâncias na Terra (e.g. ambiente marinho vs. ambiente terrestre);
(3) os seres vivos conseguem - através da alimentação, por exemplo - incorporar na sua estrutura estas proporções isotópicas.
Com base nestas assumpções desencadeiam-se cascatas de raciocínos (ou melhor, cascatas de outras assumpções, que por sua vez se desdobram em tantas outras), que permitem chegar a resultados muito curiosos. Um exemplo interessante é o descortinar as cadeias tróficas entre organismos. Está suficientemente bem demosntrado que quanto 'mais alto' na cadeia trófica se está, maior o rácio O18/O16; ou ainda mais alta a concentração de O18 em relação ao isótopo de oxigénio mais leve O16 (por ser progressivamente excrecionado na 'ascenção' da cadeia trófica). Fizeram-se experiências muito surpreendentes com seres humanos que demonstram precisamente estes resultados. Assim, o que é expectável para um vegetariano? E para um indivíduo totalmente carnívoro? Pois é, as assinaturas isotópicas revelam bastante bem o padrão acima descrito: quanto mais vegetariana a nossa dieta, mais baixo os valores do rácio O18/O16. Agora, porque não aplicar as mesmas metodologias mas para animais já extintos? As coisas complicam-se (e de que maneira...), porque as proporções isotópicas do indivíduo acabam por se confundir - devido à diagénese - com as características da rocha onde este se encontra envolvido. Este também é um ramo da paleontologia de vertebrados que está em franca expansão e que ainda é verdadeiramente embrionário... Mais um híbrido entre um paleontólogo e um geoquímico.

Fotografia da semana


Dois ossos de base do crânio de um dinossauro terópode troodontídeo bebé. AMNH.