Museu da Lourinhã, Ebulição lourinhanensis
O Museu da Lourinhã nasceu da vontade de um grupo de amigos, curiosos da etnologia e arqueologia, que faziam dos seus tempos livres uma verdadeira estufa incubadora de ideias e projectos. O GEAL (Grupo de Etnologia e Arqueologia da Lourinhã), fundado em 1981, serviu de base estrutural à criação do Museu da Lourinhã, ao qual foi mesmo concedido o estatuto de Associação de Utilidade Pública.
Em entrevista ao jornal «O Primeiro de Janeiro», Simão Mateus, ilustrador e guia de visitas do Museu da Lourinhã, falou-nos acerca da génese desta instituição, sua evolução, áreas de intervenção e principais projectos.
Faça um breve historial do Museu da Lourinhã, bem como das motivações para a sua criação.
O Museu abre a 24 de Junho de 1983 com o espólio do Grupo de Etnografia e Arqueologia da Lourinhã, Associação Sem Fins Lucrativos e Pessoa Colectiva de Utilidade Pública, associação essa que ainda hoje está por trás do Museu da Lourinhã.
A riqueza arqueológica, paleontológica, e etnográfica que esta associação possuía, há 20 anos atrás, já era de tal ordem que acharam justificar-se a existência de um Museu. A partir daí, as diversas descobertas, principalmente de dinossauros, vieram a fazer crescer a popularidade do Museu e o seu número de visitantes.
O Museu começou por ocupar o antigo edifício do tribunal e das finanças da Lourinhã e, lentamente, foi-se expandindo, tendo actualmente mais do dobro da sua área inicial, sendo, mesmo assim, manifestamente insuficiente para a riqueza do seu espólio.
Enquanto local de memória dos lourinhanenses, este Museu acolhe, em paralelo com os achados paleontológicos, uma exposição de etnografia. Qual a sua extensão e quais as vertentes abrangidas?
A exposição de etnografia deve ocupar cerca de 60 por cento da área do Museu, mais a de arqueologia, que deve ocupar 10 por cento, os dinossauros devem ficar com o restante. Muitos dos visitantes que, inicialmente, não mostravam grande vontade de ver os dinossauros, acabam por ficar muito impressionados com a quantidade e qualidade das nossas exposições etnográficas. Estas abrangem desde o mundo rural e piscícola, a artes e ofícios desaparecidos ou tão alterados que dificilmente lhes notamos paralelismos nos seus instrumentos de trabalho. Temos também a recriação de uma casa rural e exposições sobre associações tão antigas e importantes para a Lourinhã como os Bombeiros Voluntários ou a banda de música.
Descreva-nos a organização espacial do Museu da Lourinhã.
O Museu tem, no seu piso de entrada, a exposição de Arqueologia e Etnografia Agrícola, depois, no primeiro andar, situa-se a sala das profissões, sala das colectividades e tempos livres e arte sacra. Descendo ao pátio, encontramos a casa tradicional saloia e, por fim, temos o pavilhão da paleontologia, onde estão os dinossauros.
Quais os eventos culturais e outros realizados ou a realizar durante este ano pelo Museu?
Em termos de paleontologia, o Museu costuma promover exposições externas, como, por exemplo, em centros comerciais, no ano passado na Assembleia da República ou há dois anos no Palácio de Cristal, no Porto, por ocasião dos “Gobissauros”, em que aliás fomos o único Museu com peças lá expostas. Promovemos também, anualmente, o Concurso Internacional de Ilustração de Dinossauros, com a exposição dos trabalhos. Na etnografia, realizamos também exposições externas, mas, infelizmente, em menor número e com menos impacto.
Como se desenvolvem as relações com as diversas instituições com as quais o Museu interage?
O Museu tem muito boas relações com as diversas instituições com que trabalha, sejam elas estatais, ONG’s ou internacionais. A Câmara Municipal da Lourinhã mostra sempre a sua disponibilidade para nos ajudar, temos exposições promovidas por associações de outras localidades e temos também uma estreita colaboração com o Museu de História Natural de Paris, por exemplo.
Como se processam as visitas ao Museu? Existe uma vertente pedagógica nesta instituição?
As visitas ao Museu podem ser livres ou guiadas. No ano passado começámos a promover um pacote especial para as escolas, que são as visitas ao campo. Nestas visitas tentamos dirigir o discurso de encontro ao programa que se dá nas aulas, nomeadamente de Biologia e Ciências da Terra, de forma a que todos consigam entender.
Qual a média anual de visitas?
Recebemos 18 mil visitantes por ano, sendo 80 por cento de escolas!
O Museu dispõe de abertura para receber a colaboração de simples curiosos? É necessário algum requisito mínimo?
O Museu vive muito do trabalho de simples curiosos, foi assim que começou e é assim que continua a fazer muito do seu trabalho, nomeadamente, dentro da paleontologia. Trabalhamos com voluntários de todo o mundo, já cá tivemos australianos, alemães, luso-descendentes do Canadá e EUA e dinamarqueses, além de outros países. No entanto, não é requisito virem de outros países, a maioria dos nossos voluntários são portugueses, muitos das escolas do concelho da Lourinhã. Requisito mínimo é mesmo vontade de trabalhar e terem mais de 14 anos.
Faz parte dos quadros do Museu um dos especialistas de renome mundial na área da paleontologia, pode-nos falar um pouco acerca do trabalho realizado por Octávio Mateus?
O paleontólogo Octávio Mateus é um dos poucos especialistas europeus em dinossauros e tem desenvolvido toda a sua formação académica ligada ao Museu da Lourinhã, fazendo aí o seu doutoramento intitulado «Dinossauros do Jurássico Superior de Portugal». Desde menino esteve ligado ao Museu da Lourinhã, participando em todas as escavações de dinossauros.
Octávio Mateus é responsável pela paleontologia do Museu da Lourinhã, o que inclui a recolha de fósseis, escavações, estudo e publicação. Um paleontólogo tem de estudar a evolução, anatomia e toda a paleobiologia das espécies em estudo, neste caso, os dinossauros. Portugal é muito rico em dinossauros, sendo o país europeu mais produtivo nesse domínio. O trabalho do Museu da Lourinhã, orientado pelo seu paleontólogo, tem sido essencial para o epíteto «Lourinhã, Capital dos Dinossauros».
Este paleontólogo descreveu várias espécies de dinossauros novas para a Ciência, tais como o Lourinhanosaurus antunesi, Draconyx loureiroi, Tangvayosaurus hoffeti, Dinheirosaurus lourinhanensis ou Lusotitan atalaiensis.
No currículo de Octávio Mateus contam-se duas dezenas de publicações em revistas científicas internacionais. A sua ligação com a Universidade Nova de Lisboa e com outras instituições académicas nacionais e internacionais têm-lhe permitido granjear uma reputação internacional, o que o tem levado a escavar fósseis em locais como Brasil, Laos, Angola e Estados Unidos. Além das suas ligações ao Museu da Lourinhã e à Universidade Nova de Lisboa, é ainda o responsável científico de um museu de dinossauros na Alemanha.
Quais os principais projectos para o futuro?
O nosso principal projecto é a construção de um novo edifício para albergar tanto espólio que ainda temos!
terça-feira, setembro 06, 2005
Ebulição lourinhanensis- Entrevista para o "Primeiro de Janeiro"
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